Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 318/2021: Inconstitucionalidade do período experimental de 180 dias para alguns trabalhadores à procura do primeiro emprego
O Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 318/2021 veio declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, do período experimental de 180 dias nos contratos de trabalho por tempo indeterminado, nos casos de trabalhadores à procura do primeiro emprego que já tenham celebrado um contrato de trabalho a termo por um período igual ou superior a 90 dias.
Alteração do artigo 112.º do Código do Trabalho
No referido Acórdão, o Tribunal Constitucional apreciou a norma constante do artigo 112.º do Código do Trabalho que consagra a duração do período experimental, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 93/2019, de 4 de setembro, que passou a prever, nos contratos de trabalho por tempo indeterminado, um período experimental de 180 dias para trabalhadores que estejam à procura do primeiro emprego e desempregados de longa duração.
A referida alteração significou um aumento de 90 dias do período experimental para esta categoria de trabalhadores, que antes se enquadravam na categoria da generalidade dos trabalhadores aos quais se aplica um período experimental de 90 dias, representado, por isso, um aumento da duração deste período para o dobro.
Os trabalhadores à procura do primeiro emprego e desempregados de longa duração passaram, assim, no que à duração do período experimental diz respeito, a ser equiparados a trabalhadores que exercem cargos de complexidade técnica, elevado grau de responsabilidade, que pressuponham uma especial qualificação ou o desempenho de funções de confiança.
Conceitos de “trabalhador à procura do primeiro emprego” e desempregado de longa duração”
Para efeitos da definição dos conceitos de “trabalhador à procura do primeiro emprego” e “desempregado de longa duração”, o Tribunal teve em consideração o entendimento maioritário da jurisprudência, segundo o qual é trabalhador à procura do primeiro emprego aquele que nunca esteve vinculado por contrato de trabalho sem termo, bem como o Decreto-Lei n.º 72/2017, de 21 de junho, que considera como desempregado de longa duração o trabalhador que não tenha qualquer vínculo laboral há, pelo menos, 12 meses.
A decisão do Tribunal
A análise do Tribunal quanto à constitucionalidade do artigo 112.º, n.º 1, alínea b), subalínea iii), do Código do Trabalho centrou-se no princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º, e no direito à segurança no emprego, consagrado no artigo 53.º, ambos da Constituição da República Portuguesa.
Apesar de considerar que a norma em questão não viola o direito à segurança no emprego nem, em termos gerais, o princípio da igualdade, o Tribunal apreciou, em particular, no que diz respeito aos trabalhadores à procura do primeiro emprego, a situação daqueles que anteriormente tenham sido contratados a termo por outros empregadores, na medida em que entendeu que esta categoria de trabalhadores merece um tratamento diferente daqueles que não tenham igual experiência profissional.
O Tribunal considerou que o aumento para o dobro (de 90 para 180 dias) do período experimental na contratação de trabalhadores à procura do primeiro emprego apenas se justifica relativamente aos trabalhadores que não tenham tido anteriormente qualquer experiência profissional ao abrigo de um contrato de trabalho a termo para a mesma atividade por 90 dias, ainda que com outro empregador. Nesse sentido, foi declarada a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma prevista no artigo 112.º, n.º 1, alínea b), subalínea iii), do Código do Trabalho, apenas na parte relativa aos trabalhadores que estejam à procura do primeiro emprego, quando aplicável a trabalhadores que anteriormente tenham sido contratados, com termo, por um período igual ou superior a 90 dias, por outro(s) empregador(es). Consequentemente, o referido preceito legal deverá manter-se válido na parte remanescente, ou seja, deverá manter-se o período experimental de 180 dias para desempregados de longa duração, assim como para trabalhadores à procura do primeiro emprego que nunca tenham sido contratados a termo por, pelo menos, 90 dias.
Efeitos jurídicos da declaração de inconstitucionalidade
A declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral da norma prevista no artigo 112.º, n.º 1, alínea b), subalínea iii), do Código do Trabalho, na parte referente a trabalhadores à procura do primeiro emprego, anteriormente contratados a termo por um período não inferior a 90 dias, produz efeitos desde a entrada em vigor da mesma, ou seja, desde 01 de outubro de 2019, data da entrada em vigor a Lei n.º 93/2019, de 04 de setembro. Como tal, tudo se deverá passar como se esta norma nunca tivesse vigorado e, por isso, um trabalhador à procura do primeiro emprego contratado por tempo indeterminado com um período experimental de 180 dias, que já tenha cumprido um contrato a termo por um período igual ou superior a 90 dias, deverá ver o seu período experimental reduzido a 90 dias.
Marta Vieira da Silva